16.03.2022
Do portal CPADNEWS, 21.08.2018
Por Valdir Nascimento*
Foi
Tertuliano (160-220 d.C), um dos pais da igreja, quem proferiu no
segundo século a famosa frase: O que tem a ver Jerusalém com Atenas? Em
sua elocução Tertuliano estava questionando o relacionamento entre a
Teologia, representada por Jerusalém, e a Filosofia, identificada em
Atenas, o berço do pensamento filosófico grego. Na opinião do
apologista, era impossível conciliar essas duas esferas: fé e razão, Igreja e Academia.
Em nossos dias, há quem faça outro tipo de pergunta: O que tem
Jerusalém a ver com Brasília? O que tem a ver a religião com a política?
Ou, de maneira mais direta: Qual a relação entre fé cristã e política?
Para muitos, a resposta é: nada. Entendem estes que se tratam de
âmbitos completamente distintos e inconciliáveis. Jerusalém representa o
Reino de Deus; Brasília, a cidade dos homens. Jerusalém é a capital da
paz celestial; Brasília, a capital da corrupção humana. Em Jerusalém, o
poder é único e exclusivo de Deus; em Brasília, o poder pertence aos
poderosos deste mundo.
Brasília, inegavelmente, pode representar isso e muito mais. Um lugar
em que os efeitos nefastos do pecado corroem as estruturas de poder e
trazem prejuízos incalculáveis para a sociedade. Um ambiente dominado
por interesses escusos e ardis inconfessáveis.
Contudo, criar uma falsa dicotomia entre Jerusalém e Brasília, fé e política, não é uma atitude sábia e muito menos bíblica.
Primeiro, porque a autoridade dos governantes de Brasília, e de
qualquer outra esfera de poder, procede de Jerusalém, a cidade de Deus.
Com todas as letras, Paulo afirma que não há autoridade que não venha de
Deus (Rm 13.1), e Pedro nos aconselha a honrarmos ao Rei (1Pe 2.17).
Embora o poder político seja utilizado de maneira distorcida, não
significa que ele seja em si maligno, ou que a cidade seja de domínio de
Satanás. É a vontade de Deus que Brasília seja um lugar de onde
procedem leis justas, que punem o mal e instrumentalizam políticas do
bem.
Segundo, porque Jerusalém deve ser o referencial moral de Brasília. Sem
a ética teísta que exsurge da fé em um Legislador Moral, que é Deus,
Brasília não teria minimamente uma diretriz para fazer o que é certo.
Como bem afirmou Wayne Grudem (Política segundo a Bíblia): “Sem a
influência cristã, o governo não tem uma bússola moral”. Mais que isso,
de Jerusalém é de onde flui os princípios essenciais para a delimitação
do poder e responsabilização moral, a fim de evitar o arbítrio e o
absolutismo.
Terceiro, porque os cidadãos de Jerusalém têm a responsabilidade de
influenciar a política de Brasília. O testemunho cristão, afinal, começa
em Jerusalém, mas alcança os confins do mundo (At 1.8). Assim como os
cristãos primitivos abalaram o mundo de sua época, chegando a Roma, a
capital política do mundo de então, ainda hoje os seguidores de Cristo
têm a incumbência de agirem como sal da terra e luz do mundo, como uma
religião verdadeiramente profética na esfera pública.
Nas palavras de Miroslav Volf (Uma fé pública): “Como uma religião
profética, a fé cristã será fé ativa, engajada com o mundo de maneira
não coercitiva – oferecendo bênçãos a nossos empreendimentos, conforto
efetivo em nossos fracassos, orientação moral num mundo complexo e um
contexto de significado para nossa vida e nossas atividades”. Ao
exercerem uma política profética, os cidadãos de Jerusalém bradam contra
a corrupção, denunciam os erros e exortam contra as injustiças.
O que tem Jerusalém a ver com Brasília? Muito mais do que você possa imaginar!
*Valmir Nascimento é jurista e teólogo. Possui mestrado
em teologia, pós-graduação em Estado Constitucional e Liberdade
Religiosa pela Universidade Mackenzie, Universidade de Coimbra e Oxford
University. Professor universitário de Direito religioso, Ética e
Teologia. Editor da Revista acadêmica Enfoque Teológico (FEICS). Membro e
Diretor de Assuntos Acadêmicos da Associação Nacional de Juristas
Evangélicos (Anajure). Analista Jurídico da Justiça Eleitoral. Escritor e
palestrante. Comentarista de Lições Bíblicas de Jovens da CPAD. Autor
dos livros "O Cristão e a Universidade", "Seguidores de Cristo" e "Entre
a Fé e a Política", títulos da CPAD. Ministro do Evangelho em
Cuiabá/MT.
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Fonte: http://cpadnews.com.br/blog/valmirnascimento/enfoque-cristao/132/o-que-tem-jerusalem-a-ver-com-brasilia.html