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segunda-feira, 3 de novembro de 2014

A Reforma Protestante em quatro doutrinas

03.11.2014
Do portal ULTIMATO ON LINE, 31.10.14
Aos 31 de outubro de 1517, Matinho Lutero afixou as 95 teses na porta da Catedral de Wittenberg, dando início ao movimento que viria a ser conhecido como Reforma Protestante, donde se originaram, direta ou indiretamente, as chamadas igrejas evangélicas. O interesse pela Reforma não é o de um antiquário, mas sim o de verificar a identidade, o significado e a relevância da mesma para nossos dias, com o propósito de receber inspiração da fé ali vivenciada. O que Karl Marx teria percebido para declarar algo como “Lutero venceu a servidão pela devoção, porque ele substituiu a última pela convicção. Ele quebrou a fé na autoridade, por que restaurou a autoridade da fé”?

As teses de Lutero representam um marco para a recuperação da sã doutrina. Elas registram o início da teologia que produziu a reforma na igreja. Embora ainda fizessem referência a resíduos do romanismo tais como: o purgatório, o papado, os santos e Maria como mãe de Deus, sem contestá-los a princípio, percebemos, já nesse momento, as formulações embrionárias das doutrinas que vão caracterizar a identidade protestante.

De fato, Lutero não elaborou novas doutrinas, mas, numa volta à Bíblia como fonte de conhecimento teológico e espiritual, elucidou a mensagem consignada nas Escrituras que se encontrava soterrada sob os escombros da tradição medieval. Podemos resumir a mensagem da Reforma a alguns postulados:

1. A autoridade das Escrituras – Sutilmente, durante o período medieval, as tradições tornaram-se o fator fundamental para determinar os conteúdos da fé e da moral. Um monte de entulho asfixiou a mensagem bíblica. A Reforma resgatou e restabeleceu a Escritura como fonte suprema e final quanto ao conhecimento de Deus e da sua vontade, para o indivíduo e para a igreja.

2. Justificação pela graça mediante a fé – Contestando a compreensão romanista de salvação por mérito pelas obras, que tinha como símbolo distintivo a venda de indulgências (compra do perdão) a Reforma resgatou o ensino bíblico de que a salvação (perdão, aceitação diante de Deus e santificação) é concedida gratuitamente por Deus àqueles que confiam em Jesus como seu salvador. A salvação não pode ser comprada, mas procede da misericórdia de Deus para com o pecador que se volta para a cruz de Jesus.

3. A centralidade de Cristo – A igreja romana enalteceu o papa como cabeça da igreja e representante terreno da esfera celestial. Também Maria e os santos eram mediadores e intercessores junto a Deus. A reforma acentua que Cristo é o único mediador entre Deus e os homens. Só ele tem poder para efetivamente perdoar pecados. A sua obra na cruz é suficiente e exclusiva para a nossa salvação. É Ele que intercede junto a Deus, como advogado, por aqueles que Nele confiam.

4. Sacerdócio de todos os crentes – Contrastando com o ensino de que somente a hierarquia da igreja (o clero) constitui o sacerdócio autorizado para representar a Deus diante dos homens e vice-versa, a Reforma ensina o sacerdócio universal, isto é, que todos podem comparecer diante de Deus, estudar a sua palavra e ser agentes a seu serviço. A Reforma, conquanto reconheça vocações eclesiais específicas, afirma que todo o povo de Deus é igreja, uma igreja onde todos são chamados a servir a Deus.

Com essas e outras afirmações, os reformadores conseguiram minimizar o distanciamento da igreja medieval do modelo observado no Novo Testamento. Conquanto a obra da reforma não tenha sido completa – e os descendentes espirituais da reforma compreendam que a igreja reformada está constantemente se avaliando à luz do padrão bíblico – a Reforma continua sendo um marco para uma genuína identidade evangélica, em meio ao conturbado contexto religioso contemporâneo.

Essas doutrinas provocaram uma enorme transformação social porque, na verdade, foram a plataforma para a libertação pessoal diante de Deus.


• Christian Gillis é pastor na Igreja Batista da Redenção, membro do Conselho Gestor da Aliança Evangélica e coordenador em Minas Gerais da Fraternidade Teológica Latino-Americana/ Setor Brasil. Twitter: @prgillis
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Somente a Fé (devocionário de Martinho Lutero)

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Fonte:http://www.ultimato.com.br/conteudo/a-reforma-protestante-em-quatro-doutrinas

domingo, 19 de outubro de 2014

A PNPS e a histeria da “Irmandade Evangélica”

19.10.2014
Do portal ULTIMATO ON LINE, 08.10.14
Por Christian Gillis*


Em outubro de 1692, a pequena comunidade de Salem (Massachusetts, EUA), predominantemente evangélica, foi acometida por um surto coletivo de pavor de bruxaria, que durou cerca de um ano. Mais 150 pessoas foram presas, julgadas e cerca de 20 condenadas à morte, a maioria mulheres, por causa de superstição e credulidade.

Em 1938, Orson Wells provocou pânico em milhares de ouvintes crédulos, enquanto narrava em estilo jornalístico, numa transmissão radiofônica, a peça de ficção “A Guerra dos Mundos”, contando a história de uma suposta invasão da Terra por um exército marciano.

Em 2014 uma onda de histeria alcançou alguns cidadãos brasileiros, muitos evangélicos crédulos, depois que foram publicadas pela imprensa mórbida do país, informações distorcidas a respeito da estabilidade democrática da nação brasileira, frente ao decreto 8243 (23.05.2014) que institui a Política Nacional de Participação Social (PNPS). Muitos sequer leram a norma legal e deram vazão à mania de conspiração.

Ocorre, entretanto, que Constituição Federal, em vigor desde de 1988, é profundamente democrática, e estabelece já no seu primeiro artigo, sob o título “Dos Princípios Fundamentais”, que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. O decreto 8243/14 apenas articula e sistematiza (decretos não criam...), nos termos da Constituição, a legislação referente quanto ao modo como se dá o exercício do poder do povo em sua forma direta. Visa, então, consolidar e enraizar o senso e prática da democracia, indicando para o cidadão quais os instrumentos de que dispõe para expressar as suas opiniões e vontades por canais diretos – e que já estão em vigor! - bem como, dá oportunidades aos governantes e legisladores de auscultarem melhor as expectativas dos cidadãos.

Quem teria receio de ouvir mais e melhor o povo, do qual emana todo poder, povo este que não tem se sentido representado por parlamentares arredios e desconectados dos anseios populares?

Lendo e relendo o decreto 8243/14, verifica-se que a Política Nacional de Participação Social (PNPS), é intrinsecamente democrática e visa robustecer o sistema democrático brasileiro. A PNPS empodera a sociedade civil e reflete valores que são caríssimos ao pensamento e à tradição protestante, historicamente comprometida com a democracia. O decreto propugna, entre outros valores igualitários, o reconhecimento do indivíduo, a autonomia das organizações da sociedade civil, a necessidade de cooperação entre os diferentes entes estatais e a sociedade civil, o respeito à diversidade dos cidadãos, o direito à informação e o dever de transparência por parte dos órgãos públicos, a valorização da educação e da cidadania participativa, a participação social como metodologia governamental e a solidariedade e a cooperação. Ratifica também a participação das organização e movimentos da sociedade, que tem plena liberdade para se associar e fazer-se representar.

São, portanto, inverídicas as críticas levianas e espúrias atribuídas ao documento legal. Faltou leitura do PNPS e entendimento do Estado de Direito.

Claro que a manipulação ideológica do decreto, movida por setores mórbidos da grande imprensa, vinculados a segmentos parlamentares que tentam dominar por meio de aterrorizar o ideário da população ou aqueles que buscam controlar economicamente a sociedade - e aos quais não interessa a mínima ampliação e o aprofundamento da democracia – era esperado. O que causa surpresa, entretanto, é que organizações eclesiais (que aglutinam milhões de seguidores, beneficiários diretos do decreto), formulassem declarações contestatórias ao PNPS, com textos que em nada contribuem para o aperfeiçoamento da prática democrática – sendo apenas eco do discurso de grupos notoriamente reacionários - mostrando-se, assim, subservientes e contrapostas a interesses da sociedade que dizem representar.

Declarações e pronunciamentos, em geral frágeis e superficiais, eivados de erros, tanto na análise como na avaliação do texto do decreto 8243/14, foram elaborados e emitidos ao arrepio do corpo social dos que representam, produzidos sem levar em conta o arcabouço jurídico e garantias da Constituição Federal, invocando a ameaça de fantasmas e imaginando um cenário político fantasioso. Distorções grosseiras de termos, conceitos retirados do seu contexto legal, omissão de informação e deformação de afirmações, entre outras falhas elementares quanto a regras básicas de leitura (hermenêutica), estão presentes nas notas formulados para sustentar compromissos ideológicos e, talvez, até eleitorais.

Teria havido novamente uma instrumentalização de instituições eclesiásticas, por causa de interesses políticos específicos, ideológicos e partidários?

O temor alegado, de eventuais pretensões de extrapolação do poder, precisa ser visto em relação a todos os que almejam qualquer poder político, sem seletividade partidária. Historicamente as igrejas evangélicas brasileiras sempre estiveram envolvidas com questões políticas, tombadas à direita – a maioria, infelizmente, na contramão da democracia, distantes da identidade protestante reformada comprometida com a liberdade e a atenção social aos necessitados. O PNPS é importante por explicitar ao povo como fazer bom uso do poder a favor da coletividade. A chiadeira reverberada pela mídia vem da parte dos círculos sociais que mantêm o monopólio das comunicações e as vantagens derivadas da forma ainda primitiva e limitada de democracia praticada no Brasil. Democracia só o é quando para todos e em todas as dimensões da realidade.

Há benefícios evidentes para a sociedade em ter claros e organizados os mecanismos e ferramentas de diálogo democráticos entre os governantes e a sociedade que os elegeu, inclusive para os conglomerados religiosos, que poderão indicar dentre seus quadros elementos competentes para servir à sociedade.

* Christian Gillis é pastor da Igreja Batista da Redenção em Belo Horizonte, MG, e membro do Núcleo de Belo Horizonte (MG) da FTL (Fraternidade Teológica Latino-Americana - Setor Brasil. Twitter: @prgillis

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Fonte:http://www.ultimato.com.br/conteudo/a-pnps-e-a-histeria-da-irmandade-evangelica