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terça-feira, 17 de novembro de 2015

Perdido em Marte

17.11.2015
Do portal ULTIMATO ON LINE, 11.11.15
Por Carlos R. Caldas Filho*


Andy Weir é um sujeito de sorte. Escreveu um único livro – por enquanto – que já na estreia foi sucesso de vendas e, sonho de todo escritor, teve o mesmo adaptado para a telona, com grande elenco e dirigido por Ridley Scott, que não é qualquer diretor. The Martian, a obra de Weir, virou “Perdido em Marte” no Brasil. 

Uma ficção científica diferente das que estamos acostumados a ver: não é uma space opera, como “Guerra nas Estrelas”, nem uma obra com pretensões metafísicas como as de Arthur C. Clarke (popularizador da mais que questionável teoria do astronauta antigo – ou o “alienígena do passado”, tema de um programa sem noção de um canal da TV paga). 

Na obra de Weir as únicas tecnologias que existem são as que existem... Não há nada de tecnologias ultrassofisticadas que talvez não se realizem nem daqui a mil anos, como a velocidade do dobra de “Jornada nas Estrelas”. O mote da obra de Weir é bastante simples: uma expedição da NASA a Marte enfrenta uma tempestade e tem que abortar a missão. Um dos astronautas, Mark Whatney, é dado como morto e deixado para trás. Só que Whatney não morreu... E tem de encontrar um jeito de sobreviver e entrar em contato com a NASA. Uma outra expedição levaria quatro anos para chegar ao destino, o Planeta Vermelho. Tudo indica que Whatney não tem a menor chance. Mas ele não desiste. Acontece que ele é botânico, e inventa um jeito de cultivar batatas em Marte. O livro é muito bem escrito, muito verossímil, e cheio de explicações técnicas sobre os procedimentos adotados pelo astronauta, que é extremamente bem humorado e enfrenta situações capazes de levar qualquer um a perder o juízo. O livro é tão verossímil que estou em dúvida se pode mesmo ser classificado como Sci-Fi... 

A adaptação ficou bem feita, uns 95% talvez fiel ao livro. Claro, Scott se permitiu mudar alguma coisa aqui, ali e acolá. Por exemplo, o personagem Venkat Kapor, um dos diretores da NASA, no livro é um indiano (ou filho de indianos), mas no filme ele é mudado para Vincent Kapor, um negro (ou afro-americano, como os estadunidenses preferem). O final também é diferente. Enfim, como sempre, o livro é bem melhor que o filme. Mas mesmo mudando uma ou outra coisa na narrativa, Ridley Scott se redimiu, depois dos horrorosos “Deus e reis” e “Prometheus” (difícil dizer qual dos dois é pior). 

Interessante que Scott já dirigiu filmes de Sci-Fi de grande sucesso, como o inesquecível “Blade Runner – Caçador de Androides” (baseado em Do Androids Dream of Electric Sheep?, “Androides sonham com ovelhas elétricas?, de Philip K. Dick, um dos grandes nomes da ficção científica de todos os tempos) e “Alien – O oitavo passageiro”, que tinha tudo para ser um trash movie, mas que virou cult. 

O filme não tem a “pegada” humorística do livro. Scott não deu conta de introduzir no filme elementos impagáveis de humor presentes na narrativa que Weir faz de uma situação surreal: um homem sozinho em outro planeta, a milhões de quilômetros de distância da Terra, em uma situação absolutamente desesperadora, mas que ri da própria desgraça. Todavia, o filme mantém, menos que o livro, diga-se de passagem, o clima de tensão entre três polos – Whatney sozinho em Marte, a tripulação da Ares 4 voltando para a Terra, e as equipes dos programas espaciais norte-americano e chinês – sim, os chineses “salvam a lavoura” para os americanos... sem a ajuda chinesa o final feliz não teria acontecido. 

Mas é aí, a meu ver, que está o ponto de contato do filme com a teologia cristã – a importância da solidariedade, da ajuda a quem precisa. No momento em que o filme foi produzido e lançado, o mundo voltava sua atenção para a crise dos refugiados sírios tentando desesperadamente ir para uma nação desenvolvida da Europa. Mas não só os sírios. Além deles, muitos africanos correndo os mesmos riscos ou outros ainda mais graves, para chegar na Alemanha, na França ou na Inglaterra. E o que fazemos diante de tal situação? 

Pouco antes da estreia do filme no Brasil, alguns evangélicos defendiam que a Europa Ocidental não tem obrigação nenhuma em abrigar os refugiados sírios e não se sentiam nem um pouco responsáveis pela morte do menino sírio, aquele de três aninhos que morreu afogado, cuja foto correu o mundo. Fiquei a pensar em uma estória (perdoem-me os puristas defensores da ortodoxia gramatical pelo uso de palavra não reconhecida pela norma culta da língua) que o Mestre contou... 

Na estória, tal como sabiamente percebeu Guimarães Rosa – e Rubem Alves gostava de repetir –, que não aconteceu nunca para que aconteça sempre, um homem é assaltado e espancado. Um sacerdote e um levita, dois religiosos sérios, zelosos guardiães da sã doutrina ortodoxa, passam de largo e nada fazem. Decerto pensaram, “eu não tenho obrigação nenhuma de ajudar este aí, e não me sinto nem um pouco responsável pelo que aconteceu com ele”. Seriam religiosos fundamentalistas? Mas a “punch line” da estória de Jesus é surpreendente: ele subverte a ordem estabelecida ao dizer que também passou por aquela estrada um samaritano, um heterodoxo em sua visão doutrinária e teológica, desprezado pelo establishment religioso do seu tempo por não ser um homem da reta doutrina. E foi exatamente aquele samaritano que foi o herói da narrativa... 

Atualmente estamos vendo coisas estranhas no mundo evangélico brasileiro. Quem diz que a missão da igreja envolve também a ajuda concreta ao próximo e a solidariedade para com o sofredor é taxado de “marxista”. Longos discursos, com pretensão de erudição, são feitos para desmerecer, desprestigiar e desvalorizar quem diz que a missão da igreja tem que ser “integral”. A linguagem acadêmica utilizada nestes casos, com muitas citações de termos técnicos filosóficos e referências a autores, principalmente de autores ainda não traduzidos para o português, serviria para autenticar o discurso de quem diz que “missão integral” é algo errado. Ao ler estas intermináveis e enfadonhas críticas eu concordo com o velho e bom Paulo de Tarso: a letra mata. Mas o Espírito vivifica. E o Espírito sopra para dar vida (o que nos faz lembrar a poesia do Gênesis, sobre o sopro da vida...). E ao vivificar, o Espírito nos desperta para a solidariedade, para estender a mão a quem precisa. A fé sem obras em morta. A integralidade da missão nunca teve e nem tem nada a ver com Marx. Tem a ver com a Bíblia. E disto uma diversão aparentemente despretensiosa como Perdido em Marte nos faz lembrar...

*Carlos R. Caldas Filho É doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo e bolsista do PNPD-CAPES na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo Horizonte (MG).

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Fonte:http://www.ultimato.com.br/conteudo/perdido-em-marte

domingo, 12 de janeiro de 2014

Encontrando nosso caminho através das parábolas

12.10.2014
Do blog ESTUDOS DA BÍBLIA
Por Paul Earnhart


Há alguns princípios importantes que precisam guiar-nos se quisermos descobrir os tesouros das parábolas. A falta de conhecer e observar a pauta natural que governa a interpretação do tipo especial de literatura ao qual as histórias de Jesus pertencem produzirá confusão antes que iluminação.

Um exemplo clássico de como não fazer é visto no tratamento de Agostinho da parábola do Bom Samaritano. Ignorando o indício contextual, o grande norte-africano alegorizou a simples história de Jesus numa história da humanidade. O homem derrubado por ladrões (Satanás e seus anjos) era Adão que tinha, em rebelião, saído de Jerusalém (a cidade celestial) e partido para Jericó (mortalidade). Satanás tinha-o despido (de sua imortalidade) e deixado semi-morto (espiritualmente, mas não fisicamente). O sacerdote e o levita (sacerdócio e ministério do Velho Testamento) que passaram foram incapazes de salvar o homem e ele foi deixado para o samaritano (o Senhor) atar suas feridas (coibir o pecado), derramar óleo (esperança) e vinho (fervor). A estalagem é a igreja, o estalajadeiro é Paulo, e os dois dinheiros são ou os dois maiores mandamentos, ou os dois "sacramentos". Nenhum comentário sobre tão evidente excesso é necessário.

As parábolas de Jesus devem ser abordadas naturalmente, tomando cuidado para não desencaminhá-las de seu simples propósito. Elas são histórias ilustrativas geralmente concebidas para ter três partes básicas: ŒUma ocasião histórica que produziu a parábola. A história ou narrativa. E Ž a lição principal a ser extraída dessa história. Com isto em mente, olhemos para certas regras importantes a seguir na busca das mensagens individuais das parábolas.

ŒEstude a parábola em seu contexto histórico para determinar por que foi contada. Todas as parábolas foram primeiro contadas a uma determinada audiência numa ocasião específica. Por exemplo, a história do Bom Samaritano foi ocasionada pela queixa de certo advogado a Jesus, que era difícil amar seu próximo quando não podia imaginar quem ele era (Lucas 10:25-30), e as três maravilhosas parábolas sobre as coisas perdidas em Lucas 15 foram uma resposta aos ataques feitos contra Jesus pela "má companhia"  que ele estava mantendo (versículos 1-2). Às vezes esta informação de pano de fundo está faltando e o significado de uma determinada parábola precisa ser buscado na informação mais ampla dos Evangelhos, mas, quando presentes, as circunstâncias nas quais uma parábola foi contada nos dão uma indicação mais certa quanto ao propósito do Senhor para sua história. O contexto precisa sempre governar o texto.

Procure a verdade principal que a parábola pretende ensinar. Muitas parábolas pretendem desenvolver apenas um ponto, e não ser um veículo para todo o esquema da redenção. Lições secundárias podem muitas vezes ser legitimamente extraídas de uma parábola, mas isto deve ser feito com cuidado e somente depois que a mensagem principal tiver sido determinada.

Ž Não se perca nos pormenores da parábola. Os pormenores de uma parábola às vezes podem ter significado, mas na maioria das vezes eles não contêm nenhum significado oculto e são simplesmente designados a preencher a história. O bezerro cevado, música e dança, anel de ouro, sapatos e vestes da história do filho pródigo não são simbólicos de nada, mas simplesmente refletem, em termos significativos para o tempo, a alegria do pai pela volta de seu filho. Uma boa regra é não dar nenhum significado figurativo a minúcias, a menos que o contexto o autorize.

Não tente estabelecer uma posição doutrinária somente por uma parábola. Há muito que é esclarecido para nós pelas parábolas de Jesus, mas precisam sempre ser entendidas à luz dos ensinamentos claros da Escritura, nunca em contradição com ela. Estas ilustrações são mais destinadas a serem janelas do que pedras de fundação. Elas não declaram tanto uma doutrina quanto ilustram uma faceta significativa dela.

Finalmente, e mais importante, procure sempre uma aplicação pessoal de cada parábola. Depois de ter determinado a lição, ou as lições corretas da parábola sendo estudada, a pergunta mais importante é: "Encontrei a mim mesmo nesta parábola?" "Quais mudanças em minha vida e meus pensamentos esta parábola exige de mim?" Não há nada tão trágico como um estudo dos ensinamentos de Jesus que não é conduzido por mais do que uma curiosidade intelectual, a menos que seja o estudo de algum pregador que sente a necessidade "profissional" de pregar um sermão a outros sem um único pensamento de fazer qualquer aplicação a si mesmo. É imperativo, em nosso estudo das parábolas, que cada um continuamente pergunte, "Senhor, o que há aqui para mim?" Deste modo somente encontraremos os ouvidos de ouvir para os quais nosso Senhor apelou quando pela primeira vez ele ensinou por parábolas (Marcos 4:9, 23).

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